miolo
talvez esse devesse ter sido o primeiro texto da GLit porque o que trago aqui esbarra em tudo que já abordei nos primeiros sete capítulos e, provavelmente, em tudo que ainda escrevinharei.
eu preciso culpar e agradecer a faculdade por algumas coisas. essa é uma delas. apesar da minha formação não ter nada a ver com a temática de criação de conteúdo, marketing, social media, literatura ou qualquer coisa afim, ela, é claro, me ensinou muito. e me doutrinou também.
quando saí da faculdade eu escrevia muito coisas como neste diapasão, outrossim, e bis in idem. isso refletiu muito na minha escrita de histórias, do blog e tudo o mais. era ótimo no trabalho, mas pro restante, eu precisei me remodelar com o tempo.
convenhamos, ninguém é obrigado a saber o que é a tal da conditio sine qua non se não se trata de questões jurídicas.
[e olha eu desviando do assunto completamente]
pois então, a faculdade me ajudou a criar certos sistemas de análise das coisas. por isso, vez por outra crio umas pérolas que me ajudam na compreensão do mundo, seja ele real ou virtual.
quando eu falo de marketing digital ou de conteúdo (que é um papo que fico devendo para outro dia), automaticamente estou falando das correntes que criei na minha cabeça. assim, temos:
corrente majoritariamente qualitativa;
corrente majoritariamente quantitativa.
cada uma dessas correntes funciona como a diferenciação entre direita e esquerda em política. como doce e salgado nos alimentos. como noite e dia. podem se combinar e misturar e até concordar em certos aspectos, mas, em essência, não são a mesma coisa. isso porque cada uma delas tem fundações firmes em aspectos que são praticamente contrários. ou totalmente contrários.
na corrente majoritariamente qualitativa, como o nome já dá a dica, o principal norteador será a qualidade daquilo que você cria. a religiosidade com que você consegue manter suas postagens não é o foco, entende? não existe fórmula matemática que vai te dizer quanto e como e que horas postar para chegar a x, y ou z. digamos que, aqui, entra o lado mais sociológico do marketing [que provavelmente é outra coisa que eu tirei do sovaco (você também sempre pode contar comigo para citar expressões datadas, cringe e que nem sua avó usa mais, disponha)].
já na corrente majoritariamente quantitativa, como o nome também indica, o principal norteador aqui é a quantidade daquilo que você cria. o volume mesmo, sabe? números aqui são lei e a principal fonte de informação. existem, assim, fórmulas: tantas vezes ao dia, tantas na semana, dar as caras tantas vezes etc., etc., etc. aqui entra o lado matemático do marketing (que você já sabe que é uma definição que também tirei do sovaco, como a anterior).
essas duas correntes são formadas como nesse gif aqui, entrelaçadas e juntas, mas cada elo é cada elo:
cuidado, você pode querer ficar vendo isso em looping, como eu fiquei… ahaha e eu usei esse gif só porque acho sensacional, vou voltar ao foco agora.
essas duas correntes são como duas grandes árvores que podem compartilhar ideais, afinal, bebem da mesma fonte de água para se alimentar.
mas em cada uma dessas árvores vão existir diversas versões de sua essência, distribuídos por seus galhos, até chegar nas flores e frutos.
quanto mais afastado do tronco, mais flexível é essa ramificação, quanto mais perto do tronco, mais extrema e mais inflexível ela é. ou seja, mais próxima do conceito bruto de cada corrente.
afinal, não é porque corrente majoritariamente qualitativa quer, primeiro, qualidade, que ela não vai se ligar em números. e vice e versa.
desde que comecei a enquadrar os conteúdos que consumo sobre marketing digital e de conteúdo nessa esfera entre qualitativa e quantitativa, as coisas na minha cabeça se descomplicaram.
hoje em dia existem inúmeros perfis no Instagram, por exemplo, dedicados ao ensino do marketing digital, muitas vezes focado em empreendedores e muito pouco em criadores de conteúdo. e nós fazemos uma miscelânia de tudo isso e queremos que funcione, não é?
pois é. eu sei. eu sei. nem tudo que se aplica para empreendedores e lojas no marketing digital vai funcionar para criadores, reles mortais, como nós.
porém, o fato é, depois que essa separação ficou mais evidente na minha cabeça, é mais fácil identificar perfis com uma vibe mais qualitativa e os com um mood mais quantitativo.
isso é importante porque assim eu consigo filtrar melhor os que eu me identifico. e também me distanciar daqueles que seguem a outra corrente e não representam o que eu busco e entendo como importante na criação de conteúdo.
agora, pare um instante e pense em pelo menos dois perfis de marketing que você acompanha (certeza que deve ter pelo menos dois). em qual das correntes esses perfis se enquadram?
é a mesma corrente que você se considera mais próxima?
p.s.: tô pseudomisteriosa e não disse com qual me identifico, mas acho que, se não está claro até agora, com o restante do texto você não terá dúvidas. mas se precisar, futuramente também posso desenhar e criar gráficos (que serão horrorosos, mas feitos com carinho).
entrelinha
e aquele tal de slow content, onde é que ele entra nesse rolê?
eu poderia dizer que slow content é uma vertente da corrente majoritariamente qualitativa, mas vai parecer que estou me gabando… mas você me conhece, certo!?
o slow content busca quebrar o ciclo de consumo rápido de informações curtas e superficiais.
apesar do termo poder ser traduzido literalmente como "conteúdo lento", que nos faz associá-lo à ideia de conteúdo postado de forma mais lenta, ele não se resume à frequência de postagem.
o foco do slow content é na qualidade da criação. o que inclui o valor que você entrega para quem te lê. ou, em outras palavras, sobre a diferença que o que você entrega pode trazer para as pessoas.
assim, não é uma corrente que se liga em fórmulas, números e frequência pré-determinadas.
e por isso, toda essa ideia de postar de forma mais leve vai envolver também a questão de criar de forma mais leve.
tudo para que o resultado final valorize o seu tempo de criação e o tempo de quem vai consumir.
é também sobre fazer com que o marketing de conteúdo trabalhe para você e não o contrário.
qualidade, no slow content, é sobre a conexão que você estabelece a partir daquilo que você cria e entrega.
dito isso (tudo), deu pra ver como o slow content fica bonitinho dentro do meu conceito de corrente majoritariamente qualitativa, né? eu diria até que são sinônimos, mas slow content é mais gourmet.
(não vou entrar no mérito de que slow content é um termo criado em 1996 e que nessa época nem tinha rede social - e eu ainda era criança)
contracapa
essa coisa toda de slow content e de marketing, do excesso de informação que consumimos me lembrou de uma leitura que fiz em 2020.
o livro é Adultos, da escritora Emma Jane Unsworth [Intrínseca|2020] e eis a sinopse para quem interessar possa:
Jenny trabalha para uma revista on-line feminina e descolada, tem casa própria e namora um fotógrafo famoso – a receita perfeita para manter um perfil mais do que bem-sucedido em qualquer mídia social. Na rotina off-line, porém, seu cotidiano foi sugado por dramas cada vez mais intensos. Uma realidade profundamente corroída pela angústia de precisar o tempo inteiro ter na ponta dos dedos a legenda certa, retribuir a quantidade ideal de emojis para cada novo comentário, comparar-se sem piedade à perfeição das influenciadoras por quem é obcecada e manter a sanidade pelo menos até o próximo post.
Quando a situação chega a um limite – as amizades vacilam, o namoro termina e a internet parece querer seu fim -, a mãe de Jenny, uma médium pioneira nos traumas da filha, decide intervir. Agora, aos 35 anos, Jenny precisa reaprender a conviver com a mãe, aceitar seu passado complicado e as incertezas que o futuro lhe reserva, além de sobreviver à constante necessidade de validação que permeia seus dias.
apesar de não ter sido uma leitura 5 estrelas para mim, porque senti que algumas questões da personagem precisavam de maior desenvolvimento na trama, é um livro muito bom para refletirmos sobre o impacto das redes sociais nas nossas vidas.
Jenny, a protagonista, não é criadora de conteúdo como nós, mas ela criou com as redes sociais uma dependência digna de quem precisa dela para trabalhar e pagar boletos.
o que Jenny adota é exatamente o que o slow content quer contornar: o excesso.
de informações e sentimentos de comparação, validação pessoal, sistema de valores e fuga da realidade.
para além disso, Jenny é cringe. filha de uma geração que nasceu com o impresso e teve que se acostumar (muito bem, obrigada), com o mundo conectado. ela é uma millenial tão perdida quanto eu ou você estamos/estivemos/podemos vir a estar (porque estado de graça não é permanente na vida). ou sempre estaremos.
repensar nossa forma de criar e produzir passa pela nossa consciência do que vamos estabelecer como nossos parâmetros de validação, aceitação, sucesso, carreira, aprendizado e conhecimento.
porque é fácil demais se deixar levar pelo fluxo e é muito difícil se manter sempre fiel aos princípios que você acolheu e escolheu, quando todos os luminosos e vídeos sinalizam algo diferente e até oposto. mas também não é nada impossível. é um post de cada vez e uma escolha a cada tempo.
no fim do dia, muito do que nos abala acaba sendo, ao menos um pouco, sobre isso aqui:
“Você está chateada porque alguém que você não conhece talvez não goste de uma versão sua que, na verdade, não existe.” Adultos
uma edição não-mequetrefe (ou assim espero).
uma newsletter pactuada com o slow content.
e uma criadora que escolheu a corrente majoritariamente qualitativa.
ainda existe quem queira ler, ouvir, ver, escutar, apreender e ter conexões reais. eu estou aqui. você também.
se quiser me indicar uma leitura no tema, um filme, papear sobre qualquer coisa, fique à vontade para comentar ou responder a GLit. é sempre um prazer ler você também.